segunda-feira, julho 22

Sou eu!

A porta rangiu tão alto alto quando ela tentou abri-lá. Os braços nus dela estavam arrepiados e o lábio dela tremia de frio. Ela via a sala cheia de gente uniformizada. Ela viu ele encostado na parede. Quando ela entrou na sala, sentiu todos os olhares voltados a ela. Ela não era a personagem principal, não ali pelo menos. 
Era uma sessão da Câmara de Vereadores Mirins da qual ela fazia parte no ano passado. Ela só devia estar ali para assistir o comando dos novos vereadores mirins e ver um certo alguém que mexia com o coração dela.
De fato, ela merecia todos aqueles olhares. Ela entrou como uma Barbie, com cabelos presos em um coque grande e alto, olhos marcados por uma maquiagem escura e, talvez, o mais "diferente": um collant azul marinho divinamente bordado que deixava a cintura dele, realmente, muito fina, um tutu que brilhava mais a cada passo firme que ela dava com uma sapatilha dura de ponta. Era difícil andar rápido com os pés amarrados e com tanta gente olhando para ela. Ela tentava ser o mais discreta possível.
Ela acabara de chegar de um festival, mas sabia que estava atrasada para um compromisso de tanta importância, por isso, a roupa que vestia não impediu que ela fosse. 
Até quem fazia uso do microfone parou por alguns segundos. Ela, realmente, estava espetacular.
Ele não acreditou que era ela. Ela também não pensou que seria tão corajosa a ponto de passar na frente dele. Ela era, no fundo, muito envergonhada.
Ouvia as pessoas comentando sobre ela. Correu rápido para o banheiro onde o tutu foi trocado por uma calça jeans lavada e o collant ficou embaixo da mesma camisa que todos os outros vereadores mirins usavam. Ela estava até com um casaquinho fino e comprido que não conseguia esconder todo o arrepio dos braços dela. Tirou a sapatilha dura e o mais discreta que pode, saiu do banheiro com as coisas na mão.
Ainda a olhavam, agora com tudo aquilo nos braços, com uma meia fina rasgando no chão áspero, parecendo uma boneca mais "humana". Ela levantou a mão direita e como toda bailarina que se prese começou a tirar todas as ramonas que prendiam o coque. Ela sentia as mechas enroladas caírem sobre seus ombros gelados.
Ele a olhava concentrado. Ele não esperava isso dela. Ele sabia que ela seria o assunto da escola e entre os seus amigos por muito tempo ainda. Ela branca como a neve, com lábios vermelhos e cabelos escuros e longos, escrevia rápido em um bloquinho, ela era imprevisível. Sentou no chão mesmo e trocou a sapatilha por um tênis e foi procurar um amigo que estava sentado no meio da plateia. Ela foi rápida e certeira, mandou apenas um SMS e logo Guilherme, o amigo, se levantou e foi sentar com ela. Ela continuava magnifica. 
Ele não conseguia parar de olhar para ela. Ela ignorava as vibrações do celular, eram mensagens dele. Ela simplesmente não podia. 
A reunião estava chegando ao fim, fizeram os agradecimentos, falaram dela, ela apenas sorriu e então, começou a olhar para ele. E como se o mundo inteiro tivesse caído depois das palavras que a presidente da reunião disse, ela andou na direção dele. Ele a olhava. 
Ela parou antes... Bem antes de chegar perto dele. Ele juntou as sobrancelhas como quem diz: Ei, pequena, não faça isso... Juntou as sobrancelhas e correu para junto a ela, no fundo, o orgulho dele queria que todos os amigos dele vissem ele com ela. E como se se amassem desde o começo da vida, ele a juntou em seu braços e a levantou. Para ela era fácil, ela sabia como era estar nos ares. Ele beijou o pescoço dela. Ela sorriu e disse: Sou eu!

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